terça-feira, 28 de julho de 2009

AGENTES SOBRENATURAIS

Por que a humanidade acredita em misteriosos agentes sobrenaturais capazes de comandar vidas e acontecimentos: astros, almas, espíritos, fantasmas, alienistas, duendes, demônios, anjos, santos, deuses, Deus?

Faz parte dos mecanismos de sobrevivência das espécies identificar padrões e atribuir significados. Por exemplo, vultos são instintivamente associados a ameaças furtivas. Quanto mais vulneráveis estivermos, mais forte será a sensação de que o vulto é uma presença. Vultos podem ser inofensivos, mas durante a Pré-História, quem fugiu da sombra de uma árvore (falso-positivo) viveu, mas quem viu o vulto de um predador como uma sombra qualquer (falso-negativo) morreu. Porque o falso-positivo é inofensivo e o falso-negativo fatal, hoje, o homem moderno vê, ou “sente”, tantos perigos inexistentes.

Animais têm esse instinto, mas nós vamos além. Nosso cérebro é capaz de descobrir intenções em nós próprios e nos outros e não se satisfaz com a simples associação de significados, tipo vulto -> perigo, queremos descobrir a intenção, que requer um agente: vulto - > querem me atacar(comer) -> predador(leão). Nossa capacidade mental de descobrir intenções nos levou a inferir agentes, que nos levou ao espiritualismo: xamanismo, paganismo, animismo, politeísmo, monoteísmo... Deus.

Baseado no artigo Agenticity de Michael Shermer publicado na Scientific American de Junho/2009.

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terça-feira, 14 de julho de 2009

GATOS, COMO E POR QUÊ?

Gatos não servem como gado de corte (carnívoros são antieconômicos para corte), não se prestam para ajudar nas tarefas humanas e, como vimos na postagem anterior, não podem ser amansados como outras espécies. Como e por que foram domesticados?

Imaginava-se que a domesticação de gatos ocorrera no Egito há aproximadamente 3.600 anos. Recentes estudos de DNA e evidências arqueológicas indicam que o convício humano com os felinos vem de 10 mil anos atrás e se iniciou na região do Oriente Médio conhecida como Crescente Fértil. Mas a iniciativa partiu dos gatos e não dos humanos. Com a descoberta da agricultura surgiram os depósitos de grãos, que atraíam ratos, que atraíram os gatos. Portanto, o gato caseiro foi desenvolvido inicialmente por seleção natural, não por domesticação. Tiveram acesso a maior oferta de comida (ratos) próxima às pessoas os animais suficientemente audazes para se aproximar, mas não ferozes a ponto de infundir temor e provocar rejeição. Somente em um segundo momento, os humanos criaram novas raças de gatos a partir de animais já acostumados ao convívio.

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quinta-feira, 9 de julho de 2009

A VERDADE SOBRE CÃES E GATOS

Ao contrário dos cães, que exibem uma imensa variedade de tamanhos, formas e temperamentos, gatos caseiros são relativamente homogêneos, diferindo mais nas características da pelagem. A razão para essa relativa falta de variação nos gatos é simples: há muito tempo os humanos têm criado cães para ajudá-los em tarefas particulares, como caçar ou puxar trenó, mas os gatos, sem qualquer inclinação para desempenhar a maioria das tarefas que poderiam ser úteis aos humanos, não experimentaram nenhum aprimoramento de raça para tal.*

Cães, cavalos, bois, ovelhas, cabras, etc são animais que vivem em bando na natureza. Esses animais têm sempre um líder, denominado macho-alfa, com ascendência absoluta sobre os demais. Para domesticar essas espécies, o homem faz cruzamentos de animais especialmente submissos ao macho-alfa e se livra deste para substituí-lo no comando do grupo. Mas gatos selvagens não vivem em bando e, portanto, não podem ser domesticados assim.

Gatos não servem para ajudar o homem e não podem ser domesticados como os outros animais. Por que e como eles foram domesticados? (Respondo na próxima semana.)

(*) Transcrito em português da pág 62 da edição de Junho/2009 da Scientific American.

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terça-feira, 7 de julho de 2009

AMIZADES MASCULINIZADAS

© Denis Raev | Dreamstime.com

“A vida moderna, curiosamente, pode estar tornando as relações de amizade mais masculinizadas”, especula a reportagem de capa da Veja desta semana.

Os homens geralmente têm mais relacionamentos, as mulheres, mais amigos. Como fez a revista, recorro à psicologia evolucionista para explicar: na Pré-História, a mulher vivia basicamente na comunidade cuidando da casa e dos filhos enquanto o homem saía em expedições para explorar, caçar ou guerrear. Elas passavam muito tempo juntas se ajudando e se conhecendo; eles se uniam conforme a necessidade de cada empreitada e, com o tempo, conseguiam vasta rede de relacionamentos funcionais. A situação se manteve na sociedade tradicional, a mulher continuou cuidando do lar, cultivando vínculos estáveis de amizade na família, na escola e na vizinhança e o homem saindo para trabalhar e investindo em relações profissionais ao sabor das circunstâncias.

Na sociedade moderna, com a entrada no mercado de trabalho, as mulheres se obrigam a cultivar extensa rede de relacionamentos profissionais e lhes sobra menos tempo e disposição para as amizades pessoais. Para suprir a lacuna afetiva, aderem em peso aos sites de relacionamento na Internet, mas os vínculos, embora pessoais, carecem da almejada profundidade.

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quarta-feira, 1 de julho de 2009

OBA, É A CARA DO PAI!

© Juan Carlos Tinjaca |Dreamstime.com
Se a maternidade é certa e a paternidade incerta é evolutivamente razoável que o amor materno seja incondicional e o paterno seja assombrado pela dúvida: será que o filho é meu? De fato, os homens privilegiam os filhos que lhes são parecidos.

A experiência foi feita por cientistas americanos no Senegal, onde a poligamia é permitida. Na poligamia, o poderoso tem harém e falta mulher para o homem comum, o que resulta numa comunidade propícia à infidelidade de esposas negligenciadas com homens solteiros.

Trinta famílias com pelo menos dois filhos entre 2 e 7 anos concordaram em participar de uma pesquisa em troca de equipamentos agrícolas e material escolar. Foram tiradas fotos individuais de pais e crianças e recolhidas camisetas suadas deles. As fotos de cada criança e de três possíveis pais foram mostradas para 100 desconhecidos tentarem associar pais e filhos. E trezentos novos desconhecidos procuraram identificar o pai da criança pelo olfato comparando cada camiseta infantil a duas alternativas paternas.

Pais e mães foram individualmente entrevistados para se apurar o quanto os homens se dedicavam aos filhos. A partir de dados objetivos como o tempo que o pai passava com cada um de seus filhos, quanto dinheiro davam à mãe de cada um deles (lembre-se de que são famílias poligâmicas), etc, os pesquisadores tabelaram o investimento paterno em níveis crescentes de -4 a +4. A média de investimento paternal nos filhos que se pareciam e cheiravam como seus pais foi +1 e a dos outros foi -1. E esse cuidado paterno se refletiu diretamente no estado de nutrição (no peso) das crianças.

Concluindo, o amor paterno depende da convicção de paternidade, o que, realmente, faz diferença na qualidade de vida das crianças. Chocante!

Baseado no artigo Like father, like son publicado na revista The Economist da semana passada.

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