O ex-presidente Lula não via, ou fingia não ver, os desvios
cometidos em seu governo. Por sua vez, a
presidente Dilma não entende, ou finge não entender, as manifestações de rua.
Nas aldeias os costumes são menos liberais do que nas cidades grandes
porque ninguém quer se arriscar a cair na
boca do povo: comerciante com fama de desonesto não faz mais negócio, moça falada não arranja marido e assim por
diante. As mídias sociais vieram possibilitar que pessoas apartadas pelo
gigantismo dos conglomerados humanos conversem e fofoquem como se fossem vizinhos
de porta.
Em resumo, as manifestações de rua atuais acontecem porque o
comportamento do governo brasileiro caiu na boca do povo. Quando partidos de
oposição e a imprensa apontam os malfeitos do governo, as pessoas fazem piada,
comentam, mas não se envolvem, pois é briga
de cachorro grande. Mas o que cai nas mídias sociais é conversa entre
amigos, entre iguais, causa indignação.
São muitas reclamações, mas o sentimento comum é o de que os
políticos se interessem mais pelo jogo de poder do que pelo bem estar do povo, por
isso os manifestantes impediram a adesão dos partidos ao movimento. A reforma
política pode ser necessária, mas não é o que está sendo reivindicado.
No Brasil, o problema de representatividade não está no
governo, que é legítimo e foi democraticamente eleito, está nas organizações civis.
Sindicatos, uniões de estudantes, ONG,
etc. deveriam ser oposicionistas, pois têm a função de se opor à situação sempre
que seus representados se sintam desatendidos. E foram oposicionistas até que os
últimos governos os cooptaram com verbas públicas. Não é preciso
ser analista político para por em dúvida a autonomia de órgãos de representação
de classe que dependam de dinheiro público para subsistir.
Sem meios institucionais para reclamar organizadamente do
governo, restou à insatisfação popular o boca-a-boca (nas redes sociais) que
cresceu até extravasar para as ruas como ocorria nas aldeias primitivas.
O movimento pode vir a se esvaziar pelo cansaço. Mas se tal
não ocorrer, não haverá como atender a tantas e tão variadas demandas no curto
prazo. Talvez, a melhor resposta da classe política ao movimento seja demonstrar
de forma inequívoca a disposição de se sacrificar pelo povo. Por exemplo, se a
presidente Dilma reduzisse à metade seu ministério, a população reconheceria
imediatamente seu sacrifício político pelo bem do povo, ao contrário do que
aconteceu quando ela propôs um plebiscito para... fazer uma Constituinte para... mudar a Constituição para... reformar o sistema político para... um dia, se der tudo certo, haver melhora.
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